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Thiago Gonçalves

Estudo de brasileiro pode afetar compreensão sobre origem da vida na Terra

Thiago Signorini Gonçalves

10/04/2020 04h00

Visualização esquemática da magnetosfera, o campo magnético terrestre (Greg Shirah e Tom Bridgman/ Nasa/ Goddard Space Flight Center)

Um estudo liderado pelo brasileiro Cauê Borlina, do Massachussets Institute of Technology (MIT), levanta dúvidas importantes sobre as origens do campo magnético terrestre. Se confirmada, a descoberta tem um impacto até no nosso entendimento da origem da vida na Terra.

A Terra tem um campo magnético que é fundamental para proteger a vida em sua superfície. Esse campo deflete o vento solar, e evita que a nossa camada do ozônio seja completamente destruída. Assim, o estabelecimento da magnetosfera é fator decisivo para determinar quanta radiação ultravioleta a Terra recebia em sua juventude, permitindo o surgimento e evolução de seres vivos de forma muito diferente.

Esse campo foi gerado quando o núcleo ferroso da Terra se solidificou, após um início muito quente quando o ferro estava derretido. Resultados anteriores pareciam indicar que isso aconteceu há mais de 4 bilhões de anos, mais ou menos quando as primeiras formas de vida devem ter aparecido no planeta.

No entanto, Borlina e seus colaboradores afirmam não haver evidências de campos magnéticos antes de 3,5 bilhões de anos atrás. Os cientistas chegaram a esse resultado analisando minerais conhecidos como zircão, provenientes do deserto australiano.

O brasileiro explica o estudo: "Alguns minerais, quando se formam e resfriam na presença de um campo, conseguem guardar essa informação por bilhões de anos. No caso do zircão, ele se forma com pequenas inclusões de magnetita em seu interior que registraram o campo naquele momento."

Oportunidades no exterior

Borlina chegou a esse resultado durante seu doutorado, no qual estuda amostras microscópicas de minerais para entender as origens dos campos magnéticos na Terra no começo do Sistema Solar. Paulista, ele terminou o ensino médio e seguiu para a Universidade de Michigan, antes de começar no MIT.

Aqui aproveito para fazer um comentário sobre o doutorado no exterior. Também fiz o meu nos Estados Unidos, na Califórnia, e muita gente me pergunta sobre a experiência. Eu sempre respondo que é importante diferenciar os efeitos de causa e consequência.

Será que tudo lá é melhor? Temos que sair do país? Afinal, temos muita ciência de ponta por aqui também. A grande diferença é o investimento em pesquisa básica, que no Brasil já é pequeno e está diminuindo drasticamente. Se quisermos produzir prêmios Nobel, a solução não é esperar que o próximo gênio da humanidade nasça aqui; não, precisamos fomentar um ambiente científico com infraestrutura e verbas.

Só assim poderemos criar institutos como o MIT. Enquanto isso, podemos nos orgulhar de pesquisas como a de Cauê Borlina, que agora vai estudar fragmentos de meteoritos para entender melhor os campos magnéticos na formação do Sistema Solar. E torcer para que ele volte para o Brasil no futuro, quando a situação da ciência estiver um pouco melhor.

Sobre o blog

O assunto aqui é Astronomia, num papo que vai além dos resultados. Conversamos sobre o dia-a-dia dos astrônomos, como as descobertas são feitas e a importância da astronomia nacional — afinal, é preciso sempre lembrar que existe pesquisa científica de qualidade no Brasil!

Sobre o autor

Thiago Signorini Gonçalves é doutor em Astrofísica pelo Instituto de Tecnologia da Califórnia. Atua como professor de Astrofísica no Observatório do Valongo, da Universidade Federal do Rio de Janeiro, e é coordenador de comunicação da Sociedade Astronômica Brasileira. Utilizando os maiores telescópios da Terra e do espaço, estuda a formação e evolução de galáxias, desde o Big Bang até os dias atuais. Apaixonado por ciência, tenta levar os encantos do Universo ao público por meio de atividades de divulgação científica.