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Thiago Gonçalves

A Terra não é plana, mas e o Universo? Einstein defendia que sim

Thiago Signorini Gonçalves

11/06/2020 04h00

Representação da curvatura do espaço-tempo (Reprodução)

Ok, ok, a Terra não é plana. Mas você sabia que o universo é plano? E que isso tem implicações fundamentais para o nosso entendimento do Big Bang?

A curvatura do universo pode parecer um conceito abstrato para muitos. Afinal, o que quer dizer um espaço curvo? O espaço é o espaço, oras! Para cima, para baixo, para os lados, certo?

Não é bem assim. Desde a Relatividade Geral de Albert Einstein, nossa descrição do espaço – na verdade o espaço-tempo, como o próprio nome do blog indica – é mais complexa. Einstein mostrou que a presença de corpos massivos, como o Sol ou buracos negros, pode distorcer o espaço, curvá-lo. A própria luz não segue mais uma linha reta quando passa próxima a esses objetos, mas se curva como se estivesse sentindo essa distorção. Gravidade e curvatura do espaço tornam-se conceitos indistinguíveis.

Mas estamos nos referindo a partes pequenas do cosmos. Será que podemos definir a curvatura do universo inteiro?

As equações de Einstein dizem que sim. E mais, essa curvatura depende do que existe dentro do universo. Se houver matéria e energia suficientes, o universo está curvado para um lado; se por acaso não houver material suficiente para gerar a gravidade, o universo está curvado para o outro.

Para onde? Bom, é difícil descrever porque estamos falando de uma representação em quatro dimensões, mas imagine uma formiguinha andando na superfície de uma esfera. O espaço é curvo, e ela pode eventualmente até chegar ao mesmo ponto se continuar andando na mesma direção sempre. Da mesma forma, a luz percorre trajetórias estranhas nesse hipotético universo curvo.

Agora o mais interessante é o seguinte: apenas se o universo contiver aquela quantidade perfeita de matéria e energia, aquele limiar exato entre um e outro, o universo será plano, como um trapezista numa corda bamba que não cai nem para um lado nem para o outro. Seria uma coincidência incrível, não?

Pois pesquisadores estão sempre tentando medir essa curvatura, e o resultado até agora é o mesmo: nosso universo é, sim, plano. Dentro dos nossos limites observacionais, pelo menos. Mas experimentos cada vez melhores chegam ao mesmo resultado.

O desafio aqui é entender como isso aconteceu. Cientistas não gostam de coincidências e tentam explicar a origem desse fenômeno. Uma das principais explicações é o crescimento inflacionário do universo.

Segundo essa teoria, o universo se expandiu muito, muito rapidamente logo após o Big Bang. Assim, como um balão que cresce muito rápido, a curvatura passa a ser imperceptível. Ora, a própria Terra, para observadores desatentos, pode parecer plana, já que somos pequenos em relação à sua enorme esfera. Da mesma forma, esse violento crescimento inicial do universo apagaria os sinais de curvatura que porventura existissem nessa época.

A inflação cosmológica ainda não foi confirmada experimentalmente, mas esperamos estar próximos. Satélites capazes de medir a energia que viaja o espaço desde o Big Bang, a radiação cósmica de fundo, poderiam ratificar em breve essa teoria.

A ciência é assim, sempre em busca de novas descobertas!

Sobre o blog

O assunto aqui é Astronomia, num papo que vai além dos resultados. Conversamos sobre o dia-a-dia dos astrônomos, como as descobertas são feitas e a importância da astronomia nacional — afinal, é preciso sempre lembrar que existe pesquisa científica de qualidade no Brasil!

Sobre o autor

Thiago Signorini Gonçalves é doutor em Astrofísica pelo Instituto de Tecnologia da Califórnia. Atua como professor de Astrofísica no Observatório do Valongo, da Universidade Federal do Rio de Janeiro, e é coordenador de comunicação da Sociedade Astronômica Brasileira. Utilizando os maiores telescópios da Terra e do espaço, estuda a formação e evolução de galáxias, desde o Big Bang até os dias atuais. Apaixonado por ciência, tenta levar os encantos do Universo ao público por meio de atividades de divulgação científica.